O fenómeno da “escrita para toda gente” é um fenómeno
relativamente recente, porque com os chats, o FB, a cultura dos smartphones e a
nossa presença online quase 24h por dia, existem muitas pessoas que há 20 anos
não teriam escrito uma palavra desde que saíram da escola, que, nestes moldes, andam
alegremente a escrever por essa internet fora. E no meu ecrã, consequentemente.
E não é pouco.
E eu tenho um problema: O meu nome é Lu e sou uma “Grammar Nazi”
– este também um termo fruto do seu tempo, que define uma pessoa que tem
ataques de ansiedade e urticária quando um homem lhe escreve (ou uma mulher,
mas num homem é mais triste ainda, porque por vezes o pobre diabo até não se
estava a sair mal até esse preciso momento) “Gostas-te?”.
Ah, e não – podem esquecer
essa esperança – numa conjugação implicativa de narcisismo ou pelo menos
auto-amor, mas mesmo no sentido de “Gostas-te da nossa tarde na/em/no” [inserir
actividade que a pessoa em causa achou que eu ia achar piada ]
E o grammar nazisismo não se fica por aí, porque eu não
tenho os meus ataques em silêncio, guardando as minhas emoções para mim (isso é
o preconceituoso dos erros, que imediatemente, ao ver, “Terminei o curso à dois
meses” assume que o interlocutor é um idiota, mas que não passa daí); nem sequer comento apenas com quem me rodeia ( isso é o racista da ortografia acompanhado, que
goza em contexto doméstico), não, eu
sinto-me impelida a ir, organizadamente, até ao fim e, por baixo do meu achado
deprimente, colocar um “*” seguido da correcção. Porque às vezes é mesmo
deprimente. Em testemunhos de luto por exemplo.
E agora pensam vocês que eu sou uma cabra pedante (check!)
que não tem mais nada que fazer que criticar quem não teve o privilégio de ter
uma escolaridade mais avançada, porque teve de ir trabalhar, ou quem não criou
hábitos de leitura porque a vida não permitiu, e que a qualidade das pessoas
não se mede pelos seus erros ortográficos (nem estilísticos, nem de
pronunciação) e isso e tudo verdade. (Vá, posso discutir a parte da “cabra”,
eventualmente) e claro que prefiro quem me escreva “comessas a xatear” mas até
seja uma pessoa idónea do que um traste culturalmente e gramaticalmente polido,
mas cada vez mais acredito que escrever correctamente não tem de estar ligado à
escolaridade.
Estou a terminar um curso superior que tem uma média de
entrada algo elevada (não conta como ufanice porque entrei por concurso
especial, haha) que deveria supor que a fina flor das boas notas de secundário o
frequentam, e que as aulas são leccionadas por pessoas com doutoramentos, na
sua grande maioria. E é verdade. Mas não obstrante, é inacreditável a
quantidade de vezes que me tenho de arrepiar, e, mentalmente, levantar um dedo
esclarecedor quando num slide de um docente leio “torsão de estômago”.
Porque aparentemente, há (com h) dois tipos de pessoa a
escrever sem erros: os que são ávidos leitores, escrevem eles próprios, gostam
de toda a forma de comunicação que envolva letras e línguas (no sentido de
idiomas, pervs!) e por isso têm facilidade nessa area, e simplesmente nunca
lhes ocorreu sequer ter dúvidas entre presseguir/perseguir (ou até preçeguir,
quem sabe); mas também um outro grupo de, maioritariamente homens, que não lê,
mas tem a sorte de ter uma memória fotográfica para aquilo que está correcto. Que
me faz alguma confusão, mas é uma bela dádiva. Porque socialmente correcto é
escrever sem erros.
Claro que entretanto estamos para isso como estamos para a
condução: independentemente de ir a 60 ou a 130km/h, quem vai mais devagar que
eu é uma lesma estúpida, e quem vai mais depressa um atrasado mental com
encontro marcado com o senhor da gadanha.
Porque bem bem, estou eu.
Ou bem que
vou a pé, e exijo que os carros parem na passadeira porque, olha, porque vou a
passar, né, e o peão (não pião!) tem direitos, ou bem que vou a conduzir e acho
uma falta de respeito os peões que se atiram para as passadeiras vindos detrás
de não sei que Ford Transit, só para eu, pobre condutora ter um piripaque quando
quase, inadvertidamente, lhes acelero o tal date com o cavalheiro da gadanha!
Quero com isto dizer que o nosso próprio erro é sempre muito
menos grave: certa vez escrevi “ir a uma escursão” e achei muito plausível, até
ser chamada à atenção pelo meu respectivo da altura e perder a legitimidade de
fazer textos destes durante alguns meses. Mas acho “escursão” um erro muito
aceitável, nada a ver com “prencípio”.
E confesso que em alemão sou muito
disléxica. Dislexia é aquela palavra fixe que legitimiza os erros, porque soa a
doença, e toda a gente sabe que faz trocar as letras. Não creio é que faça
escrever quaisqueres em vez de quaisquer, por muita boa vontade que tenha...
Dito isto, o mais importante é o coração da pessoa há nossa
frente, e que agente se dê bem e seja-mos felizes, que o resto é só traçinhos
pretos em fundo branco, e nao tem nada a haver, e nem devemos descriminar por
isso! xoxoxox