sexta-feira, 30 de julho de 2010

Paris-Veneza

A noite em Paris acabou num banco de rua, a partir do qual do qual impressionei os meus rapazes com uma performance de sono à la texugo francês com uma duração de cerca de doze horas, afirmam eles. Não digo que fossem doze, mas foram umas quantas. Sossegada pela distância segura de 300 metros da gare, onde não pudemos ficar por duas razões: primeiro porque fechava, e segundo porque a mitra toda tinha me visto lá dentro com um laptop, em prol do blog.

Na manhã seguinte, por volta das 9 seguimos caminho até Munique, onde esperavamos poder tomar uma banhoca, já que não íamos conseguir dormir lá uma noite, visto que o comboio nocturno para Veneza se apresentava como a única alternativa viável. Em Munique, após seis horas de viagem e uma mudança de veículo em Stuttgart, apeamo-nos em München-Pasing, onde tenho bons amigos.

O Pete, que é cego e incrívelmente desenrascado e simpático foi nos buscar à estação, fomos até casa dele lavar uma casca de morraça dos chãos de estações e aeroportos que já nos cobria os corpinhos danone, comemos um esparguetezinho (pouco) e voltamos de autocarro+comboio para Munique, carregados que nem ouriços.

Trancámos as nossas meninas num cacifo, por 5€ e iniciamos as nossas 4 horas de passeio na Baviera. Ainda mal tinhamos visitado a primeira loja da Beate Uhse, uma cadeia de sex-shops de renome, e já achavamos que era pouco tempo. Os Mr. X e Y babaram-se um pouco por cima dos variados artefactos de borracha e latex, e ao serem confrontados argumentaram que era melhor estarem interessados nas pachachinhas de bolso do que nas pilocas de todo o tipo de materiais, inclusivé o set para fazer um molde de gesso do próprio membro. Não percebo a questão do “melhor”, mas enfim, os homens têm uma tendência para serem um pouco mente-fechados.*insert more inappropriate homosexual jokes here*

Tendo então re-abastecido o nosso stock de eroticofernália na qual não entrarei, aqui, em detalhe, estava na hora de ver alguns monumentos, desta vez em pedra e outros materiais inanimados, e não o tipo de “monumentos” em calças de ganga apertadas que o Mr.X nunca persegue. Uma vez na movimentada zona pedestre, confirmei que de facto as pessoas que vêm do mesmo sítio são realmente muito parecidas, quando avistei uma miúda que parecia tal e qual a minha amiga Isabel, que mora em Munique, e com a qual nos íamos encontrar. Mesmo parecida... Mas esperem, era ela! Ela mais o novo namorado, o Jonas, e aqui tenho de fazer um aparte: os namorados da Isabel são de facto um campo muito interessante. Se eu já tinha e tenho um fraquinho pelo anterior (acerca do qual a última palavra ainda não está dita), este então é bem capaz de ser ainda mais fofinho... francamente! Super-simpático, cute as a puppy, e ainda por cima falava inglês.

Fomos ver um ou dois monumentos importantes de Munique, a Frauenkirche e o Rathaus, mas sem muito sucesso, pois os meus acompanhantes tinham ouvido as palavras mágicas “bier” e “garten” e interessava-lhe mais a cultura cervejífera do Sul da Alemanha do que o seu património arquitectónico. Experimentaram dois tipos de cerveja, e, ainda que reluctantemente, um pouco de bratwurst com sauerkraut (salsicha com chucrute) e em menos de nada estava na hora de corrermos que nem doidos em direcção à estação. Perdemos o Jonas pelo caminho, mas as suposições da Isabel de que ele devia ter ido comer não se provaram veridicas, uma vez que ele ressurgiu minutos antes de o comboio arrancar, com três cervejas “como deve ser” para a nossa viagem. Nem tive coragem de dizer que não bebia... e de facto, após em Paris acidentalmente se pedirem 3 cafés, e eu beber um deles, e depois experimentar uma espécie de panaché, um dos meus Misters já tinha avançado a hipótese de eu chegar a Portugal a fumar cigarros.

A viagem até Veneza foi feita no interior de um compartimento com 6 beliches, na companhia de um japonês, e dois puppies de internacionais, um sueco-dinamarquês chamado Robin e um americano-assuecado chamado Jeff, que competiam os dois na mesma equipa de Natação em Denver ou qualquer coisa assim. Por altura de eles me começarem a elogiar o inglês os traidores dos meus compinchas, já com duas cervejas no bucho (cada um) (e das alemãs, que são grandes) abandonaram-me ignomíniamente, deixando-me à mercê das histórias de bezanas dos dois puppies loiros que andam a gregoriar their way across Europe. Charming.

Enfim, eu conversei então com os semi-bebedos que não conhecia, enquanto que os semi-bebedos que conhecia se divertiam aos montes, no corredor, ficando cada vez mais etilicamente impossibilitados de se portar civilizadamente, a dada altura vieram-me pedir a máquina fotográfica e com ela iniciaram um pagode do qual eu suspeitava que resultassem fotos pouco próprias (soava como se estivessem a põr os cús fora da janela e a tirar fotos a essa actividade) ao ponto de eu ouvir uma cacofonia de tal forma grande vinda do exterior do compartimento que levantei a orelha da almofada para escutar melhor:

brrblablalalalaHAHAHA...brrblrblrblrnhumabfihehehehehe*caralho*bladibladiHAHA

Eram eles sim. As alhadas à tuga não enganavam ninguém. Riam a bandeiras despregadas, e fumavam cigarros sem fumo só para atrofiar os picas. Comuniquei ao resto do compartimento que a versão oficial seria que eu não conhecia os barulhentos senhores, e que aliás, tinha vindo da Suécia ontem, e ficámos assim.

Não sei se os meninos conseguiram dormir alguma coisa de jeito, mas é certo que no dia seguinte às 6 da manhã tivemos de saltar do comboio sem sequer lavar o trombil e arrastar as nossas empoladas patinhas rumo à cidade dos canais.

Em Veneza tivemos sorte e azar, sorte porque estava um dia lindo: era cedo, estava agradável, e estava tudo vazio. As calle, as fundamenta, os sotoportegos, as ramo, as rio tera, as salizadas, enfim, todas as veias e artérias das cidades, incluindo os malcheirosos canais. Passámos a porte do Rialto, a primeira ponte a passar o grand canal, que inicialmente era de madeira mas depois foi reconstruida em 1588, sendo portanto “nova” para cronologias venezianas.

O célebre mercado de Rialto estava a abrir na altura em que chagámos lá. Rialto fica em S.Marcos, que é um dos seis distritos ou zonas administrativas nas quais se divide Veneza desde 1170, quando foi assim organizado para permitir uma melhor coordenação militar, para conseguir combater mais eficazmente as frotas das forças turcas. Os outros cinco distritos são: Castello, Dorsoduro, Santa Croce, San Polo e Cannareggio, sendo que os monumentos mais conhecidos ficam em S.Marcos, na grande piazza, que àquela hora da manhã tinha todo o pitoresco charme da Veneza de Lord Byron.

Um luz suave, poucas pessoas, arquitectura maravilhosa, como farnel tinhamos a fruta fresca que acabaramos de comprar no mercado, e havia inúmeros pombos que com pouco esforço puderam ser persuadidos a vir comer à mão e pousar sobre nós. Desta vez sem acidentes intestinais. Quando tinhamos dado a volta das vacas, que é aquela que implica olhar para tudo, dizer ah! E oh! Mas não perceber nada nem ter nenhuma profundidade histórica, quis convencer os mininos a fazer uma visita guiada a pé, o que me foi veêmentemente negado, a ressaca é um casaco que pesa (ai que maravilhosa é a liberdade de expressão na virtualidade da internet!) e suas excelências não queriam.

O Mr Y porque não via o ponto “why”, e o Mr.X alegando o Parâmetro 1, em vista dos 18 euros que a coisa custava. Enfim, acordamos que eu iria na visita das 15h, devendo depois recriar a experiência para os dois abandonadoiros de senhoras. Mas, como diria o Mr.X, um mal pequeno para um bem maior, pois ao abandonar-me a mim ficariam livres para acompanhar a parte feminina dos 21 milhões de turistas que palmilham as calçadas de Veneza todos os anos. Ou pelo menos para aquelas que lá estivessem nesse dia, tivessem mais de 12 e menos de 40, e usassem mini-calções, de preferência, o que parece ser a grande moda do verão, e que se lixe a celulite.

Mas ainda faltava tempo para a visita começar, e decidimos encotrar algo em que rilhar o dente, encontrand, por fim, um restaurantezinho bem longe do centro, no qual uma pizza custava em média 8 euros. Pedimos 3 pizzas e recusamos as bebidas e o cestinho de pão e grissini, explicando o low budget. Era uma pizza de prosciutto+funghi, uma de funghi porcini, e uma de oregãos e achovas, todas com queijo e tomate, obviamente. As anchovas, para quem - como um dos dois Misters - não se lembra o que é, são uns filetes de sardinha minúsculos, castanhos, que sabem terrívelmente a peixum e sal. Não sei quem pediria semelhante coisa. A altura da conta vai para o índice F, um novo índice que irei criar para além do índice por cidade visitada, e cuja inicial remete para a sua finalidade: será o índice dos f*dões, no qual já figuram o F1- Lulas confiscadas, o F2- Água a 4 euros, o F3 – Sistema de rega às 7 da matina e finalmente o F4 – o COPERTO.

O Coperto resume-se a uma filha da putice (mesmo) que consiste em extorquir do inocente turista um valor ridículamente alto pela simples razão de ele existir na sua forma sentada, naquele estabelecimento. Já não basta que descaradamente cobrem 10% de “Servizio”, que seria a gorjeta que sempre interpretei como uma delicadeza facultativa, como ainda juntam mais taxas! A conta final lia:

3x Coperto = 6 euros

3x Pizza =26 euros

Subtotale = 32 euros

Sevicio 10% = 3,20 euros

Total =35,20

Quando se estava à espera de 26€ no total, faz diferença. Entre planos de vingança sofisticada como colocar 30 € em cima da mesa e bazar, alegar falta de meios absoluta aliada a pobreza juvenil, ou mandar 4 berros, optámos por discutir um pouco e depois pagar e calar. Em Roma sê romano, e em Veneza, sê falcatruado na pizzeria.

E ainda por cima a pizza não era nada de especial. Moral da história: se cá vierem, não comam no “Da Alvise”. São antipásticos e maus. Perdão, antipáticos. “COPERTO, COPERTO! Enitália, COPERTO!” exclamava a criatura dando vontade de responder “Socci nu trombi, inportugali, socci nu trombi, vá falcatruí pró raio qui parti!” E fanculo também.

De barriga cheia e a mais um passo de concretizar o meu objectivo neste interrail que é levar o Mr.X à falência, lá me deixaram no posto de turismo para a minha visita guiada, com uma italiana chamada Frederica, que falava um inglês com um sotaque de tal forma italiano que se fosse eu teria vergonha de abrir a boca, quanto mais falar em público e querer ser paga por isso. Mas admiro a coragem, e tirando uma vozinha de rato (mas nem todas podemos ser generalas meias-alemoas) ele fez um bom trabalho. Infelizmente a volta não abraggia (ups, até já se me safam os dedos para o italiano) (para a língua italiana, claro está, que de resto estou como o Mr.X, não olho para ninguém) abrangia, digo, a piazza de S.Marco, mas somente o distrito à volta da mesma. Mas aprendi coisas giras na mesma, algumas das quais já fui semeando discretamente ao longo do texto numa tentativa de aparentar maior cultura geral do que aquela que de facto possuo...

Assim descobri que a piazza de S.Marcos é de facto a única em roma a portar esse nome, enquanto que as outras praças e pracetas de têm de contentar com o humilde “Campo”, que vem mesmo de campo, pois eram terrenos de terra batida até ao século XIII, quando foram calcetadas com uma espécie de tijolos que só no século XVII deram lugar às actuais lajes de pedra tamanho A4 que pavimentam as ruas. Muitas destes “campos” tem uma igreja e o nome de um santo associados, como aliás, toda a cidade, que tresanda religiosidade. Fomos visitar dois dos mais belos exemplos de igrejas barrocas na cidade, a de S.Moisés e a de S.Mario del Giglio, que partilham uma característica que testemunha mais uma vez a bondade e humildade inata do ser humano. Ambas datam de periodos da histório tão remotos quanto o século X e ambas foram renovadas e arranjadas no século XVII, por duas grandes famílias venezianas, os Fini e os Barbaro o que não só levou à embarroquização terrível das façadas como também da adição de grandes estátuas de membros da família pagante e altos-relevos das suas vidas grandiosas...

É também da praça de Maria de Giglio que parte a procissão do feriado de 21 de Novembro, que se dirige até à igreja da “Salute” na piazza S.Marco, e que assinala a data do fim da última epidemia de peste bubónica na cidade de Veneza.

Também aprendi que Veneza tem um dialecto diferente do italiano padrão (como seria de esperar) que se manifesta em diferenças a nível semântico, como por exemplo o “campo del calegheri”, a praça dos sapateiros, que em italiano padrão se diria “calssolari”. Neste campo a nossa guia chamou-nos à atenção para os velhos poços de pedra que se encontram em quase todas as pracetas e que serviam como reservatório para recolha de água da chuva. A água caia sobre os telhados, e era conduzida até ao chão, e einflitrava-se nos reservatórios debaixo dos poços através de lajes especiais, furadas para o efeito. Esta questão da água era algo que nunca me tinha ocorrido, mas, de facto, sendo uma espécie de ilha artificial construida sobre a água toda a água potável teria de vir da chuva, ou ser penosamente trazida de barco. Isto leva a que, em tempos idos, os pobres bebessem a água duvidosa dos poços de água da chuva enquanto que os ricos bebiam bem e de importação.

Aliás este tipo de desconfortos ilhéus, aliados ao problema de ser uma cidade museu está a provocar uma espécie de donuts effect, aliás, um fenómeno registado em estudos urbanisticos (ou como se chamam os estudos que estudam este tipo de geometria citadina), com o centro a desertificar devido à deslocação de todos os nativos do centro para a periferia. Se há um século atrás eram 120.000 venezianos verdadeiros a residirem no centro, hoje em dia não passam dos 60.000. E os edifícios históricos estão todos a ser comprados por russos que os transformam em hotéis e pensões. É a única coisa que é uma pena, na cidade das gondolas, é que está de tal maneira turistico que já não se “sente” a verdadeira Veneza, e tudo para turistas, tudo caro, tudo pré-fabricado, e por muito bonito que seja, sente-se um pouco falta do rústico, das pechinchas, dos achados, no meio de tanto picture-perfect itália para baifes como nós.

Ah, e mais uma vez o preço das godolas. Já da primeira vez que fui a Veneza não andei, devido aos preços proibitivos, e desta vez, a arcar com o P1, ainda menos fui, né? Para a próxima levo um bote de borracha pintado com spray preto, e faço a festa. E até sei o aspecto exacto que a parte da frente da gondola verdadeira deve ter: deve ter uma peça de lata com a forma do grand canal, com seis pequenas protuberâncias que simbolizam os seis distritos, e, por vezes, ainda com três enfeites que representam as três ilhas, Murano, Burano e Torcello. Posso sempre fazer um, com um pacote de leite aberto.

quarta-feira, 28 de julho de 2010

Faro-Paris

Ora beim, ora beim. Estou sem spellcheck e sem tempo para segunda leitura, perdooem erros e gralhas, que com certeza populam estas linhas. Tá bem?

Aqui estamos para mais um relato das viagens entusiasmantes da yours truly... o diário de Bristol Jones é por este meio continuado, pela voz de mademoiselle Sophie, Ouais, porque eu agora já sou uma cidadona do mundo, já estive em Paris!

De modo que arranjei dois guarda-costas, chamemos-lhe complicado Mr.Y (Why?) e o Misterioso Mr. X que de resto não olha para rabos nenhuns, Mr.Y e Mr.X, para os amigos. O Mr. X é aparentado de alguém que me está a tomar conta do gaiato, e o Mr.Y é uma adição muito recente ao meu circulo de influência, que me chegou por via Mr.Ex. Sim, eu também pensava que estas coisas dos Interrais (digam-me lá o plural de Interrail) eram coisas de adolescente, e que se faziam com um grupo de amigos íntimos, etc... mas olhem, não mais sou adolescente, e não tenho amigos íntimos que se prestem a estas coisas, de modo que teve de ser assim.

Após mudar um apartamento inteiro da Linha de Cascais para terras transtaganas, que são, enfim, a minha linda sina, e após vasculhar os cerca de 30 (felt 300) sacos de lixo preto que contém os meus haveres, os haveres da casa, os haveres do cão (são muitos) os haveres do meu irmão, e ainda os haveres de um incógnito Sr que usa boxers cor-de-laranja – sim, é complicado explicar um par de boxers cor de tijolo que não pertencem ao meu irmão, nem ao mê respectivo – após, então, escavações arqueológicas prolongadas e pouco eficientes nesses ditos casulos da mudança, dos quais consegui extrair uns bons 75% daquilo que queria, estava pronta para partir para Faro, de onde apanharíamos o avião para Paris Beauvais.

A partir daí os planos eram nebulosos rasando o inexistente, mas sempre seguindo dois parâmetros: Não podemos rebentar o budget e Have fun. O primeiro parâmetro, de ora em diante referido como P1, chega a ser um pouco limitativo, especialmente no caso do Mr.X que o aplica com uma tal força e determinação que chega a ser elevado a P1+. O P2 é bastante elástico, muito subjectivo, e por vezes entra em confronto senão incompatibilização com o P1.

Desrespeitámos desde logo o P1, e em vez de levarmos um farnel como deve ser do minipreço, na bagagem de porão, não, adquirimos alguns itens de alimentação numa bomba da gasolina perto do aeroporto, conhecida pela sua economia (NOT) e uma ligação criminosa com a secção de controle da bagagem, mas adiante. Adquirimos pois, como bons tugas que somos, vários tipos de bichos com tentáculos em molhos diferentes, como já dizia o Terry Pratchet: tudo o que é comida esquisita dizemos que sabe a galinha, e quando está excepcionalmente bom os tentáculos nem sequer arruinam a experiência. Neste caso, como latinos trogloditas que somos, até afirmamos que sem tentáculos a experiência não seria a mesma. Há, no entanto, para além dos nórdicos incultos, outras pessoas que não reconhecem umas boas lulas de caldeirada como comida, mas sim as carimbam como bomba de gel com mais de 100gr, de modo que ficamos imediatamente despojados dos nossoa caríssimos cocktails molusculoff em detrimento da nossa felicidade e satisfação pessoal. Como o colocaria o Mr.X: 1ºF*dão.

Mas enfim, há mais tentáculos que marinheiros, e não deixamos que esse contratemo nos arruinasse a disposição.

Por razões de P1, resolvemos, uma vez que aterrávamos por volta das 10 da noite, dormir a primeira noite no aeroporto, mas isso antes de sabermos que se tratava de uma espécie de aeródromo rafeiroso a 80 km de paris, onde era tudo menos glamoroso pernoitar. Apanhamos o shuttle a 15€ por tentácul...perdão, cabeça, e lá fomos nós direitos a Paris. Pelo caminho descobri que o Mr.Y fala francês melhor que eu, uma vez que morou 14 anos na Suiça, e que a comunicação estava garantida. Eu cá adoro francês, mas é uma experiência um pouco frustrante uma vez que estou habituada a falar como uma... enfim, como vocês de certeza sabem melhor que eu, e nessa língua linda de morrer vejo me subitamente reduzida a um de Gnurfs Uhm Uhm, uma espécie à qual não apercio muito pertencer.

Uma vez chegados à cidade das luzes, verificámos que estava a chover, e não era pouco. O que iramos nós fazer? Vageamos um pouco, apreciando pela primeira vez o peso das nossas bolbosas companheiras de viagem, Moxila, Mochilah e Mo-chilla, que de balança pesavam todas entre 10 e 14 quilos, mas que em quilos psicológicos acabavam por ascender a pelo menos uns 30, com asas cortantes e ásperas que desde logo iniciaram a tarefa inglória de nos amachucar as omoplatas, esfolá-las, especialmente onde já haviam sido queimadas pelo sol, aliadas à boa velha da compressão resultante da gravidade que puxava impiedosamente as latas de comida e as poucas e terrívelmente práticas peças de roupa que as enchiam. A chuva francesa, viemos a descobrir, é uma verdadeira madame caprichosa, ora parava (em sincronia absoluta com o poisar de malas) ora começava torrencialmente, ao comando “Asa”, que foi o primeiro comando que ensinei aos meus amores, e que os leva a auxiliarem-me com a asa da Moxila, que é um pouco teimosa, e requer tensão externa. Inicialmente o comando deve ser seguido de um “se faz favor amável”, acompanhado de um sorriso, e recompensado com um obrigado, mas gradualmente, com o avanço do treino, o duplo comando e a recompensa podem ser eliminados até ao ponto de o Mr em questão executar a acção automáticamente e mesmo quando amuado/com fome/distraído pelo rabiosque daquela ruiva boazuda (o que, óbviamente, nunca aconteceria ao Mr.X, que é absolutamente imune.

Tinhamos um mapa de Paris e começámos a passear aleatóriamente pela cidade, cansados e mal-habituados, resmungando que o arco do triunfo era pequenino, a torre só tinha rebites e não porcas para souvenirs, que cheirava a xixi, que não havia água, e que não havia internet. Mas voilá que nous sommes wrongues, e havia água pois, num episódio To Be Continued que gostamos de apelidadar de F*dão nº2. As aguinhas mesmo por debaixo daquele monte de ferros velhos custavam 4 eurónios! E nós comprámos uma...irk!

Enfraquecidos pelo gasto terrível dirigimo-nos para o parque em frente do museu militar, no qual patrulhavam imensos militares armados e também polícia normal, da azul, e demos início à operação “Não, não estamos a acampar aqui, o que vos leva a pensar isso??”. Esta operação consiste em permanecer sentado, com um ar alerta e conversador, como quem eheheheh, je suis français e je m’amuse comme ci toutes las nuites, e muito gradualmente então ir desmoronando: O Mr.X manteve sempre os óculos de sol postos como manobra de dissuasão, e não, de modo algum, para olhar para as loirinhas magras de seios grandes que passavem pela boulevard, o Mr.Y andava a patrulhar, e moi, je estendi o saco de cama e depois com intervalos de 10 minutos: 1)abri-o fecho, 2)deitei-me em cima dele, 3)descalcei-me, 4)entrei, 5)tapei-me e 6)dormi até o Mr.Y me acordar com berros de “Está a chover!” que fizeram as nossas cansadas ossadas ergeuer-se com uma obediencia espantosa, e daí a 2 minutos estavamos a caminhar rua abaixo, debaixo de uns suaves chuviscos que mal molhavam.

Às 3 da manhã.

Perto do Louvre (dentro do Louvre, pelo que descobrimos depois) tivemos de fazer a escolha difícil de nos deitarmos para um resto de noite descansada debaixo de umas câmaras vigilantes, ou num lindo jardim com relva ligeiramente húmida. Optámos pela relva, pelo menos o Mr.Y e Eu, o Mr.X, numa manobra de rara sorte e nenhum mérito à inteligência escolheu um banco de jardim, no qual se encaixou.

Dormi que nem um passarinho, com o saco de cama por cima da cabeça, até ouvir, sobre a fina camada de fibras de poliéster uma chuva torrencial, esta sim, digna de sobressalto. Enfiei o focinho para fora do meu involcro e vi-me, qual agente secreta no meio dos lasers, no cross-fire, ou melhor, cross-water de cerca de 8 bicos de rega automáticos que esguinchavam água de uma forma mais violenta que o emporcalhado senhor do anuncio de Axe. De um pulo, pus me na vertical. De um pulo, tomei duche. De um pulo não consegui fazer nada porque tinha as pernas contidas numas espécie de unipedismo forçado, sendo o melhor a fazer afastar-me com 4 grandes pulinhos que fariam inveja às criaturas do sítio do pica-pau amarelo, e que efectivamente provocaram mal-estar e dor ao Mr.Ex, sobre o qual me precipitei, de pés juntos, na minha fuga desenfreada, com um saco de cama encharcado e enlameado (sorry babes!). Feito isto, o melhor que me ocorreu foi não sujar também as meias, de modo que gritei um monte de ordens pouco claras ao desgraçado do Mr.Y (Apanha as minhas coisas! Não! Sim! Também a mala! Ai o meu bilhete e o passaporte! Não atires para aí! Os sapatos, ai os sapatos!) que ele acabou por acatar com uma rapidez e desenvoltura admiraveis, com certeza frutos da adrenalina de se ver encharcado em água gélida enquanto ainda tinha as marcas da relva na bochecha.

Que trio lastimável que jazia agora sobre o banco. E como se não fosse o suficiente ser acordado assim tão cruelmente, um pombo ainda cagou em cima do Mr.X, que desde então tem de prestar sempre muita atenção à parte do lenço que enrola perto da boca, ao agasalhar o pescoço. Precisava de sacudir o saco-de-cama, pelo que o bati contra a tília mais próxima, enchendo as nossas bagagens e os restantes pedaços limpos com salpicos de lama, para alegria geral dos felizes contemplados. Partimos para o Louvre, eram 7:20 da manhã. Thou shalt not sleep under the sprinklers at the early hours of morrow. Estava fechado. Seguimos para a Gare do Nord para planear os próximos passos da viagem, que deveriam levar-nos a Veneza. Impossível, já não havia vagas para passes de interrail. Então para Munique. Tudo bem, a demorar 22 horas? Não obrigado. Para Munique na mesma noite? Não, que não dava tempo para nada. E se fosse...? Enfim, demorou cerca de 1 hora até nos conseguirmos coordenar, o pobre senhor do guichet foi de facto incansável, e lá conseguimos algo de medianamente satisfatório, que nos levaria até Munique e daí no night train mediante o pagamento de 10 euros por pessoa em suplementos de dorminhoquiçe em beliche (não é bem este o termo) até Veneza. Isto até Munique dia 28 de manhã, e para fair Venice were we lay our next scene, ao longo da noite de 28 para 29. De Julliet, bien sur.

Agora era só deixar as nossas três meninas num cacifo, e podíamos hit the city.Mas oh, não havia cacifos, por questões de anti-terrorismo. As pessoas poderiam plantar latas de polvo lá dentro, God forbid. Isso significou milles de miles com 50 kgs cada um às costas. Por vezes, a subir e quando as pausas já não aconteciam há muito ascendia aos 60 kgs por pessoa. Somos melhores que qualquer máquina de guerra dos fuzileiros, que pelo que consta só levam 30kgs!

Entretanto, como o meu único propósito neste Interrail é, na opinião do Mr.X, fazê-lo gastar dinheiro desnecessariamente, convenci os mosqueteiros a fazer uma visita guiada à cidade, sendo que esta, maravilhosamente, se dividia em dois, um passeio de barco pelo rio Seine, e a volta de autocarro com os fones normais. Não deixo de insistir que um guia vivo é muito mais giro, mas enfim, não se pode ter barato e de qualidade excelente e na hora. Como o meu maninho mais piqueno me explicou, são três premissas que se excluem umas às outras, sendo que é impossível juntar as 3: Rápido, Barato e Bom.

E Barato foi, barco+bus por apenas 19 euros, o que é que os meninos querem mais? Quando quero sou bastante convincente, acho eu, e tenho a mania de que preciso de ter informação detalhada, o que me leva a fazer trabalho de casa minucioso sobre o local onde vou, ou, na impossibilidade de o fazer, de optar pela guided tour. Não gosto de ficar tipo vaca a ver passar o comboio, tendo uma vaga ideia que a pirâmide alongada na Place de la Concorde é um Basilisco, para a hilaridade geral dos mais informados.

Fizemos a volta turística, e vimos tudo, desde o referido obelisco da discórdia franco-egípcia, passando pelo Louvre, com as suas pirâmides (só por fora) os pallais grands, petits e moyens, a torre, os champs, as inúmeras pontes sobre os rio, norte dame, os quartiers latin .... falta-me, de momento a força para detalhes históricos, prometo adenda.

Por fim, quando as forças nos faltaram, atravessamos o Seine à altura da isle de la cité, onde fica Paris como a conhecemos dos filmes, com luzes amareladas, concertinas e violinos, varandas de ferro forjado cheias de plantas, miúdas lindas, magras que nem cadelas e estilosas ao chic parisien.

E agora já fui assediada pelo menos 7 vezes em 40 minutos, os únicos 40 minutos que estive sem companhia masculina, e vou interromper para retomar asap. Bisoux**