quarta-feira, 23 de outubro de 2013

O Elogio da Loucura

Este vem a propósito de um post do 9gag que traçava uma relação entre a vida triste e deprimente no mundo real e a necessidade/vontade de nos refugiarmos em jogos de computador onde podemos ser os melhores e ter letras brilhantes no ecrã a dizer: Congratuations!!! Isto porque esse post tinha inúmeros comentários de pessoas que concordavam a 100% com isso, centenas de likes para alguém que dizia “That’s how I survived my shitty childhood”.

Há uma música que me dá que pensar bastantes vezes, e que transmite mesmo o que penso sobre isso... diz a letra:

I'm surprised/ that you've never been told before/That you're lovely/ and you're perfect,/ And that somebody wants you//

E no meu grupo de amigos há várias pessoas, de ambos os sexos, a quem eu gostava de cantar isto muito sentidamente.

Vivemos numa sociedade cruel não só para os cães, sobre os quais muito falo quando me dão trela ;-) mas também para os cachorrinhos interiores de cada um de nós, os nossos egozinhos frágeis, que tentam sobreviver, a grande custo, num mundo de reforço negativo, castigos, multas, necessidade de ser homemzinho, mulherzinha, grande, culto, crescido, interessante, desenvencilhado e sei lá mais o quê.

E se não formos? Se formos só frágeis e patetas, sem muita certeza de onde é que fica o Suriname e se se calhar é ao pé do Vietname, e com a sensação que todos os outros sabem o que andam aqui a fazer, e que a qualquer momento aquela pessoa que realmente interessa vai descobrir que afinal somos uma pequena fraude ignorante e peluda. Com tornozelos feios.

But are we?

Há alguns anos atrás, quando li um livro da Karen Pryor, sobre como o reforço positivo influencia o comportamento de qualquer ser vivo (até de uma ameba!), tomei uma resolução à qual me tento manter fiel: If it’s nice, say it twice! Se algo é bom, bonito, bem feito, simpático, tento dizê-lo à pessoa. Seja um colar novo, seja uma apresentação interessante, seja um gesto agradável e charmoso.

E chego à conclusão que lamentavelmente as pessoas não estão preparadas para ouvir um elogio. Algo tão simples quanto “Oh, isso está tão bem feito” suscita uma palete de comportamentos tão díspares quanto corar, negar, reduzir a acção a algo insignificante, fazer uma piada, ficar sem reacção ou até com um ar duvidoso... Sim, porque eu devo andar a inventar mentiras, não tenho mais nada que fazer.

É curioso. Fui às lágrimas com uma boa amiga, há dias, quando lhe disse, sentidamente, aquando de uma saída conjunta: “Cheiras muito bem”. A isto ela respondeu-me com uma velocidade incrível: “Meh, não é nada, é só o meu perfume barato que é uma imitação do Gucci, comprei nos chineses por 3 euros”

Quê?! Mas eu perguntei alguma coisa? Chiça... Ali fiquei a saber que o perfume é “barato”, “imitação”, “comprado nos chineses” e que de resto devo ser idiota... sim, porque a não-aceitação de um elogio sentido é quase um atestado de burrice à pessoa que o faz: estou então completamente enganada, não cheira bem, não está bom, não é bonito nem atraente, e eu é que sou um freak do bosque por achar isso.

Pessoas, podem-me dar direito à opinião? Tudo bem que é sempre uma tentativa de modéstia, que é bonito, e que também salvaguarda o dito ego, que é um cachorrinho que está sempre à espera que a outra pessoa de repente aponte o dedo e diga: HAHAHA, NÃO, IDIOTA! ACREDITASTE?! CLARO QUE ÉS UM FALHANÇO!

Mas eu não vou dizer nem pensar isso. Gosto de cachorrinhos, e gosto de pessoas, e tento não magoar ninguém de propósito (já basta quando ando a rinocerontar e provoco danos colaterais). Podem honestamente sorrir-me de volta e dizer “obrigado/a”, porque sim, faz bem ouvir que somos bons. E somos. Numas alturas mais, noutras menos, mas em muitos momentos estamos a ser muito fixes, e temos o direito de ouvir isso e de acreditar nisso.

Porque é que será tão mais fácil acreditar nas coisas más que nas coisas boas? Porque é que um comentário leviano sobre um qualquer aspecto físico ou psicológico tem a capacidade de nos destroçar, quando são precisos doses copiosas de elogios até que acreditemos um bocadinho?

Todo o ego é frágil, até o daquela pessoa que parece estar no topo do mundo, e todo o ego precisa de um miminho. Já deu um abracinho ao seu, hoje?



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