quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Roma – Não só, mas maioritáriamente F*dão

Roma, part II

Nas tendas ao sol está quente.
Esta é daquelas verdades universais que qualquer campista descobre mais tarde ou mais cedo, preferencialmete quando se chega todo roto a um parque, dez minutos antes de fecharem as portas, quando toda a gente já está a lavar a loiça mas ainda pairam no ar os cheiros a ravioli de lata e sopas de pacote cheias de intensificadores de sabor, e em modo automático, se monta a tenda num fantástico espaço livre.

Na manhã seguinte, por volta das nove, descobre-se que o espaço estava livre pela simples razão de não ter sombra a partir das 6 da manhã, e emerge-se suado, meio cozido, com os cabelos colados à testa e a boca seca, com vontade de dormir mais umas 12 horas num local fresco, escuro e ao abrigo dos odores. E assim nos aconteceu em Roma. Por volta das sete da manhã ouvimos um sonoro e inconfundível CLOUC, um som que reverbera em vidro, um som que nos pós de orelhas afitadas, quais capitães Hadoques, (por favor digam-me que alguém percebe esta referência ao imortal Tintim de Hergé, senão sinto me culturalmente isolada). Olá! Uma garrafa de Borgonha? Não era de Borgonha, mas era de facto uma garrafa, nomeadamente a do decapante barato que os misters tinham comprado ontem, e que o Mr.Y tinha consumido quase na íntegra, por eu ser careta e o Mr.X um cortes. O calor tinha feito a rolha saltar!

Ninguém ia conseguir dormir com temperaturas que faziam literalmente saltar a tampa, de modo que nos levantámos e perdemos um dia inteiro numa espécie de estupor pós-furto que quase parecia estarmos de férias. Nem eu, que sou notóriamente bossy tive força para obrigar fosse quem fosse a ir ver monumentos...ficámos na piscina, no bar do parque, a comer pizzas, fizemos umas compras no supermercado ali da rua, e tive de comprar um biquini novo. Odiei. Eu tinha um biquini lindo, brazilian bottom, daqueles que faz um bom rabo até a quem não tem um bom rabo, e chiça pá, não me apetecia nada ter de o substituir por um boob-squishing padrão de cortinas de velha. Triste.

No entanto, apesar de a vida social no parque ser fácil e divertida, havia que voltar ao ritmo, life, the show, the monument seeing must go on! Marcámos visita guiada à borla para o dia seguinte, e lá nos metemos no metro com os bilhetes do autocarro e os dedos em figas, pois tudo o que não precisávamos era ainda sermos apanhádos em infraçcão de bilhetes.

No metro, fizemos uma descoberta hilariante: Um ovo! Um ovo debaixo de um dos bancos. Tenho foto, escrevi no blog, aconteceu! Esta premissa, diga-se de passagem, também funciona ao contrário, se não há foto, se não está no blog, não aconteceu. Eventualmente na eminência de provas fotográficas incriminadoras poderá negociar-se a hipótese de ter acontecido apesar de não estar no blog, mas essa vertente implica muito burocracia e em noventa por cento dos casos é negado o deferimento. Mas voltemos ao ovo. O que fazia esta potencial prole ali tão sozinha e abandonada? De que rabiosque provinha, ou seja, que tipo de prole era? Afinal tratava-se de uma situação de risco, quem é que não ouviu já falar na eclosão da guerra? E se este fosse um ovo bélico? Mais valia dar-lhe uma sapatada, antes que acontecesse o pior, e ele se desfizesse em revoluções ou dinossáurios.

Mas por outro lado, como presença constante ao longo dos museus e da pintura tinhamos visto a retratação da hostória mitológica de Leda e Zeus, um romance amoroso algo zoofilo entre uma mortal e um cisne que resultou na postura de um/dois ovos que por sua vez originou/originaram 4 rebentos: os gémeos Castor e Pollux, a linda Helena de Tróia e ainda Clitemnestra, que viria a ser esposa de Agamémnon. Ora se toda esta gente tinha eclodido assim, parecia um crime contra a humanidade não dedicar algumas linhas a este ovo romano, ou não fosse Roma uma das, senão a mais importante cidade da antiguidade e um dos palcos de eclosão da civilização. (... ... ... .... pausa para os gregos se mandarem ao ar)

“Posto” isto, perdoem o pun, vou já saír do registo ovíparo, falemos um pouco de aspecto mais históricos e do que aprendemos na nossa visita guiada, que saiu da Piazza di Spagna, em frente do McDonalds. Demoramos cinco minutos extra a achar o McDonalds, pois estávamos de tal forma condicionados ao símbolo vermelho e amarelo que em preto e branco não o reconhecemos. Concordo que há que manter as fachadas históricas sóbrias e clássicas, mas há coisas que são de certa forma e não de outra, e dar o McDonalds como referência e depois mudar as placas não dá com nada. Até nos cortou o efeito pavloviano de salivação perante estímulo visual.

Esta praça é um lugar icónico em Roma, ponto de encontro de todo o tipo de turistas, maioritáriamente, naquele dia, alemães. Tinhamos acertado nos dias da peregrinação de toda e qualquer diocesezeca da Alemanha a Roma, e creio que, de acordo com os queixumes sobre a baixa de natalidade terrível que este país afirma estar a sofrer e considerando as hordas de adolescentes corados e com chapéus distinctivos das respectivas igrejas e catequeses, a Alemanha devia estar despojada de jovens. È que não devia lá restar nem um! Estavam a ocupar todos os centímetros da escadaria imponente que leva à igreja de Trinità dei Monti, estavam debruçados não só na fonte no centro da praça, na forma de um barco (Barccacia), que é afetuosamente chamada pelos romanos de La Barcaccia, ou velha banheira, da autoria de Bernini, inspirada numa ocasião em que as águas do Tibre subiram de tal forma que levaram um barco até ao local, mas em todas as outras fontes que viriamos a encontrar pelo caminho.

E Roma tem muitas! Foi das coisas que mais me impressionou lá, para além dos seus inegáveis dotes de furto a turistas, a quantidade de água potável límpida e fria que corre esbanjadamente de estátuas, fontes, torneiras e elementos decorativos. Dava para encher as garrafas de água em todo o lado, e tudo isso graças ao general romano Agrippa que construiu o primeiro aqueduto no séc.I a.C, trazendo a água da montanha até à cidade, até aos dias de hoje.

Começando pela fonte, e continuando um pouco por toda a cidade era impossível escapar ao Baroco e ao nome de Bernini, mas também a um outro nome menos conhecido mas não menos ilustre na sua área – um eterno concorrente de Bernini, o arquitecto e escultor Borromini, que ao invés de Bernini, (que era um homem do sul, um latino de Nápoles, socialite, bem falante, polido e charmoso que trabalhou para 4 papas), era um nortenho (suiço) melancólico e tinha um feitio difícil e irascível, acabando por se suicidar. Mas enquanto vivo, ia cruzando recorrentemente o caminho de Bernini, sempre na condição de enteado onde Bernini era filho.

Este contraste e esta competição está retratada de forma interessante e intemporal nas fachadas do Collegium Urbanum, edifício que que data do século XVII, foi comissionado pelo papa Urbano VIII “Barbarini” e era a sede da congregação da propaganda da fé, que tendo sido começadas por Bernini foram terminadas por Borromini, e são consideradas obras-primas do arquitecto. Era característico de Borromini alterar superficies convexas e concavas, e em comparação com a fachada elaborada por Bernini, podemos constatar que as de Borromini são bastante mais inovadoras, quabrando as regras clássicas, que mais uma vez, foi demais para o seu tempo...

Seguimos para mais uma igreja de séc. XVII, a Sant'Andrea delle Fratte, que para além de uma torre por Borromini tem no seu interior dois incrívelmente expressios anjos de mármore por Bernini. Esta parelha de criaturas divinas fazia parte de uma manada de 10 que gracejava uma ponte sobre o Tibre, mas das quais apenas duas eram verdadeiros Berninis, sendo que os outros eram obras feitas pelos alunos do grande mestre escultor, uma aldrabice óbvia, pelos vistos, uma vez que podemos verificar que os dois verdadeiros foram retirados da ponte e expostos na igreja.

Um pouco por toda a cidade podemos ver as marcas de uma subida de nível de vida. Não na acepção comum da expressão, pois os romanos continuam a ter necessidade ou vontade de roubar turistas inocentes que dormem que nem cordeirinhos, mas no sentido literal, uma vez que, por volta de 1500 a cidade tinha ascendido ao estatuto de centro religioso do mundo, e tinha efectivamente sido nivelada por cima, o que se reflectiu numa subida de vários metros do nível das ruas, etc, que podemos ver nas escavações arqueológicas que passámos a caminho da Fontana di Trevi, a fonte na junção de três ruas (tre vie) que assinala o local onde termina o reconstruido aqueduto de Aqua Virgo.

Reza a lenda que a fonte que o abastece terá sido encontrada pelos romanos com a ajuda de uma virgem que andava (com certeza bela e seminua, e nunca gorda, com celulite, buço e virgindade imposta por ninguém lhe pegar) a saltitar pelas montanhas, a 13 kms da cidade, uma cena representada na façada da fonte. Para além disso temos uma representação do Oceano ou deus dos mares, numa concha puxada por cavalos marinhos e sereios, flanqueado pelas virtudes do papa, representadas sob a forma de mulheres em vestes esvoaçantes, a salubridade, com a simbólica cobra (sim, já olharam para o símbolo das farmácias? O simpático bichinho rastejante é saudável sim!) e a abundância, com a sua corneta cheia de gomas. Ou outras coisas, vá. A impressão geral desta fonte é qualquer coisa difícil de explicar, é muuuuito baroco num só sítio, é muito cheia, muito imponente, muito linda mas ao mesmo tempo tão rica que pode ser vista como irremediavelmente kitsch. Como pessoa que gosta de decorar o seu quarto com ramos e hera artificial, eu adorei, mas ouvi segundas opiniões menos favoráveis.

Como curiosidades curiosas, para não ser demasiado histórica e formal, deixem-me contar-vos que todos os dias são lançados nesta fonte cerca de 3000 euros é proibido nadar na fonte, apesar da água ser fantástica e limpa mas claro que de vez em quando há um exibicionista qualquer que se atira lá para dentro vestido de golfinho ou com um tridente enfiado no sim-senhor, só para ter 10 minutos de atenção. Francamente, há pessoas que são verdadeiras attention whores...Desculpem, alguém viu o meu tridente?

Na Piazza de Pietra tivemos o privilégio de observar o Templo de Adriano, que, à semelhança de muitos outros edifícios antigos em Roma no renascimento foi utilizado como pedreira – o exemplo mais óbvio disso é o coliseu, mas do qual mesmo assim sobrevive um flanco imponente. O interesse na conservação deste tipo de edifícios é surpreendentemente recente, começando a evidenciar-se no início do séc. XX.

E chegávamos ao Panteão de entre os edifícios construidos época greco-romana o mais bem-preservado. É de mármore do tipo cippolline, que tem o aspecto de textura de cebola e foi reconstruído por Adriano, após ter sido vitima de um incêndioDesde que foi construído que se manteve em uso: primeiro como templo dedicado a todos os deuses (daí o seu nome) e, desde o século VII, como templo cristão, a igreja de Santa Maria dos Mártires. É famoso pela sua cúpula, que foi durante muito tempo a maior de toda a Europa, até que Brunelleschi criou a cúpula (duomo) de Florença, completada em 1400 e trocópasso. A cúpula do panteão tem um buraco no meio que serve de fonte de iluminação e curiosamente por uma junção de factores físicos não faz com que chova lá dentro, uma vez que tem um efeito de chaminé, com massas de ar ascendentes que impedem a chuva de caír na vertical e inundar o templo. Para além de templo, o panteão é também mausoleu de vários VIP italianos, como Rafael e dois reis italianos, entre outros.
Havia ainda umas aplicações de bronze nos pórticos do panteão que o papa Urbano VIII, da família dos Barberini mandou retirar de lá para o usar na basílica de S.Pedro, um acto de vandalismo sobre o qual um crítico anonimo disse “Quod non fecerunt barbari, fecerunt Barberini”, no sentido de “o que os bárbaros não estragaram, estragaram os Barberini” ;-)

Na Piazza Navona, praça construída sobre a área do antigo estádio domiziano é uma praça desde sempre associada a jogos, festividades e competições, costumava ter uma forma concava, como uma grande poça de água, e uma vez por ano os escoamentos das fontes eram tapados para a praça inundar e servir de chapinhação pública a romanos pobres e ricos. A Fontana dei Quattro Fiumi, a fonte dos quatro rios é central das três fontes magníficas que a praça ostenta, e é, também, da autoria de Bernini. Até à construção da Fontana di Travi era a fonte mais imponente de Roma, e é mais um pomo e palco da rivalidade entre Bernini e Boromini.

Como Bernini tinha sido o artista de eleição do papa anterior, Inocêncio X não quis usar o mesmo escultor para desenhar a sua fonte, mas a proposta de Boromini para o projecto foi bastante simples, e Bernini acabaria por conseguir o trabalho através de uma matreirice: oferecendo um modelo da fonte como ela é à cunhada do papa, que era quem usava as calças na casa papal, e quem acabou por persuadir o papa a escolher Bernini. Esta é uma das várias histórias, não afirmo que seja a verídica...

Na fonte encontram-se representados 4 figuras que simbolizam 4 rios (os quattro fiumi), o Nilo para África, o Ganges para a Ásia, o Plata para a América do Sul e o Danúbio para a Europa. O Tejo teria tido muito mais estilo. Huh. Como nessa mesma praça se encontra também a igreja de Sant’Agnese, de Boromini há uma interpretação cómica mas pouco fundamentada das posições dos deuses fluviais, que diz que o Plata, que está numa posição de medo, de braço erguido, teria medo que a igreja de Boromini desabasse sobre ele, mas na realidade a fonte foi completada bastante tempo antes da igreja...não deixa de ser divertido, e é daquelas conversas que fazem recordar pormenores artísticos.

Ainda houve uma outra ocasião muito engraçada em Roma (sim, para além de sermos gamados para o gáudio surpreendente de inúmeros familiares e amigos que seguem este blog... nem sabem o que me custa ler 10 vezes que a parte em que sofremos mais foi a que provocou mais riso!!), que foi a da menina do metro.

Dizem mundos e fundos das italianas, certo? Morenas, de madeixas reluzentes, curvilíneas... E das suecas... esguias e loiras com olhos azuis e pele imaculada...e das francesas...charmosas e fatais, com grandes olhos e bocas sedutoras...e das brasileiras com os seus rabos arrebitados e sotaque de português com mel. Não percebo porquê. Atão e as portugas, pá? E as portugas vira-lata, traçadas de alemoas? Com narizes arrebitados e personalidades irritantes...também são fixes pá! Enfim, com tantas turistas foi-nos difícil chegar a conclusões definitivas acerca deste assunto, mas houve uma italiana que teve muitos pontos:

Estamos nós no metro, a caminho do parque de campismo, quando entra uma miúda novinha, com uma indumentária que escandalizaria até à morte qualquer avó menos moderna que a minha: um cinto-saia, um top mostra-mamas, botas pelo joelho, 80% da cara constituida por camadas e peças amovíveis e um cabelo aloirado até à brancura. Era boa, admitidamente. Não bonita, mas boa. Sim, porque eu tenho uma teoria, segundo a qual se trata de dois parametros diferentes: Há miúdas que são boas, podres de boas, mas que não são nada bonitas. E há miúdas bonitas as que não são boas. E depois há os raros casos daquelas que são as duas coisas, mas essas são sempre burras.

Esta ou era uma adolescente iludida, naquela fase em que ainda não se percebeu que por vezes menos é mais e que não vale a pena tentar disfarçar um nariz grande pondo camadas de base cada vez mais grossas no resto da cara, numa espécie de nivelamento geral, o que é certo é que também não tinha percebido outro pormenor mais importante ainda: se quisermos conservar algum pudor, quando a saia é mais curta que um palmo e meio de coxa temos de nos sentar de pernas cruzadas. Obrigatóriamente. Senão toda a gente, e especielmente os Mr.Y’s rebarbados vão conseguir ver que as cuecas são de renda vermelha e semi transparente e que a depilação é bilabial. Pois.

Cerca de cinco minutos, dois litros de baba masculina e alguns pensamentos meus sobre a objectificação da mulher a nível sexual mais tarde, resolvi ser uma cabra insensível, como de resto me é recorrentemente dito, e pôr um termo na coisa: Eye-contact. Eye movement. Ligeiro apontar com o queixo. E Zuca! A barraca fechou com um cruzar de pernas embaraçado da proprietária. E depois quero que os misters gostem de mim. Não gostam. Pois com certeza que não gostam.Mas tem de haver um bocadinho de solidariedade de vez em quando, não? Para equilibrar.

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